As reações dos governos britânico e brasileiro no episódio do envio irregular de lixo hospitalar e doméstico ao Brasil, disfarçado de importação de polímeros de etileno para reciclagem, não poderiam ter sido mais ilustrativas da diferença de mentalidade e seriedade dos dirigentes dos dois países.
Colocados diante de problema de interesse público, que pode pôr em risco a saúde da população, no Brasil, a resposta foi basicamente midiática.
Recorrendo mais uma vez à estratégia da "política-espetáculo", o ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, protagonizou cenas da mais primária demagogia, deixando-se filmar e fotografar como pinto no lixo, entre os 26 contêineres interceptados pelas autoridades alfandegárias no Porto de Santos.
E, na entrevista coletiva que concedeu depois da "vistoria", sob a luz de holofotes, valeu-se da velha retórica "politicamente correta", classificando a exportação de lixo como "racismo ambiental", acusando os países ricos de converterem os países pobres em "lixeiras" e prometendo criar um grupo de trabalho para investigar "os crimes e o passivo ambiental" que teriam sido causados no Brasil por empresas estrangeiras, nos últimos anos. Por sua vez, o presidente Lula aproveitou o episódio para tentar fazer graça e para posar como estadista, procurando converter um problema policial em questão diplomática.
"Eles (os países ricos), que são tão limpos e querem despoluir tanto, mandam para cá contêineres de lixo dizendo que é para reciclar. Mas quem é que vai reciclar uma camisinha?", disse ele no discurso de abertura da 5ª Feira Internacional de Produtos Orgânicos, depois de afirmar que pretende convocar uma "discussão mundial" sobre a questão ambiental.
O discurso foi feito no mesmo dia em que o Itamaraty denunciou o governo britânico - que nada tem a ver com a exportação irregular - com base na Convenção de Basileia, que regula o transporte de materiais tóxicos pelo mundo, e pediu providências imediatas da Organização das Nações Unidas (ONU).
Enquanto isso, com a tradicional discrição britânica, o governo de Londres fazia o que se espera do poder público num caso como esse. Em apenas três dias, as autoridades abriram investigações, descobriram a origem do material exportado, identificaram as empresas responsáveis pela remessa ilegal de lixo para o Brasil, cuja sede fica na cidade de Swindon, na região de Wiltshire, e prenderam três suspeitos que, embora libertados ontem, continuam à disposição da Justiça.
Eles estão sendo interrogados pela Agência de Meio Ambiente e, segundo a chefe da Divisão de Lixo e Administração de Recursos do órgão, Liz Parkes, serão sumariamente denunciados à Justiça criminal britânica caso as investigações comprovem que agiram de maneira dolosa.
Além disso, Liz Parkes afirmou que está aguardando as investigações das autoridades alfandegárias e policiais brasileiras, que estão apenas no começo - embora o governo brasileiro disponha já de dados concretos sobre os empresários responsáveis pela importação irregular -, para autorizar a devolução desses contêineres para a
Inglaterra, definir os locais apropriados quando chegarem ao País e tomar as providências para cobrar de todas as empresas britânicas envolvidas na transação o ressarcimento dos gastos com frete, taxas portuárias e custos administrativos.
Paralelamente, o Comitê de Meio Ambiente, Alimentos e Questões Agrícolas do Parlamento britânico decidiu reabrir consulta pública sobre as estratégias administrativas e jurídicas a serem adotadas para o tratamento do lixo no País, depois do caso envolvendo o Brasil.
O objetivo é verificar se os mecanismos de controle sobre o destino do lixo vigentes no
Reino Unido permanecem adequados e eficientes e se as sanções penais, administrativas e pecuniárias previstas pela legislação ambiental ainda são suficientes para coibir as exportações ilegais.
O
governo britânico agiu com rapidez e objetividade, enquanto os dirigentes brasileiros optaram pelo palanque e por uma retórica do mais puro estilo chavista-bolivariano.